Livro importante
Coluna do Brickmann
Na terça-feira (4/9/12), das 19 às 21 h, no hall monumental da Assembléia Legislativa de São Paulo, sai o livro Faria Lima, uma história de amor por São Paulo. Faria Lima foi um dos prefeitos mais populares da cidade, incansável, implacável com seus auxiliares, de quem sempre exigia o máximo (como era brigadeiro, seu apelido era Mobil Oil, marca de lubrificantes cujo símbolo era Pegado, o cavalo voador). Para a cidade, suas decisões foram boas e más: por um lado, iniciou as obras do metrô, que há mais de 40 anos estavam planejadas e não saíam do papel (o projeto, a propósito, estava obsoleto, e teve de ser inteiramente refeito); por outro, liquidou a boa e extensa rede de bondes elétricos que ainda circulavam pela cidade, sem fumaça ou poluição, e hoje fazem muita falta.
A família de Faria Lima reuniu grande poder: seu irmão, o brigadeiro Roberto Faria Lima, homem educadíssimo, foi comandante da Força Aérea no Rio de Janeiro, na época a mais importante unidade do país; seu irmão, o almirante Floriano Peixoto Faria Lima, perto de quem Dilma Rousseff seria uma espécie de madre Teresa de Calcutá em termos de delicadeza e afabilidade, foi governador da Guanabara e responsável pela fusão da cidade com o estado do Rio.
Dono de grande prestigio popular, o brigadeiro Faria Lima por pouco não chegou à Presidência da República: morreu de infarto numa das reuniões em que os militares concluíam as articulações para transformá-lo em candidato único nas eleições indiretas. Foi pena: no lugar dele, quem assumiu a Presidência foi o general Emílio Médici, que comandou a fase mais sombria da ditadura militar.
Faria Lima deixou dois herdeiros políticos: o filho José Eduardo, que nunca tomou gosto pela coisa, e o sobrinho José Roberto Faria Lima, filho do brigadeiro Roberto, que por várias vezes, como deputado federal, foi escolhido pelos repórteres de Brasília como um dos melhores parlamentares do Congresso.
O eterno prefeito de São Paulo
Ele se chamava José Vicente de Faria Lima. Na Aeronáutica era o Brigadeiro Faria Lima, depois eleito tornou-se o Prefeito Faria Lima. Na realidade ele era o jardineiro de uma rosa, uma rosa chamada São Paulo, regada com o suor do povo trabalhador desta terra.
Faria Lima é quem melhor representa o espírito e o dinamismo desta cidade mundial cuja vocação é liderar e apontar o futuro para os brasileiros. Neste ano estamos comemorando o centenário de nascimento do eterno Prefeito de São Paulo.
Chegava ao mundo em 7 de outubro de 1909 no bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, aquele que seria o mais paulista de todos os cariocas. Faria Lima era o mais velho de cinco irmãos. Filho de João Soares Lima, imigrante português casado com uma capixaba de personalidade forte, D. Castorina Faria Lima. Todos ingressaram na carreira militar e atingiram o generalato em suas respectivas forças, a Aeronáutica e a Marinha de Guerra. Todo era tríplice coroado, que em linguagem militar, significa dizer que todos eram primeiro alunos de suas turmas. O Almirante Floriano Faria Lima, que foi o Governador da fusão dos Estados da Guanabara e Rio de janeiro ainda vive com seus 91 anos.
Faria Lima teve uma brilhante biografia militar, tendo participado com o Brigadeiro Eduardo Gomes da criação da Aeronáutica sendo um dos pioneiros do famoso CAN, Correio Aéreo Nacional, fator decisivo da integração nacional. Formou-se Engenheiro Aeronáutico em Paris.
Nas idas e vindas da carreira, ainda como Coronel, acabou transferido para São Paulo para o Parque da Aeronáutica no Campo de Marte. Destacou-se como administrador e ficou conhecido pelo apoio que a unidade militar que comandava oferecia a nascente indústria automobilista.Acabou atraído para a política pelo Presidente Jânio Quadros, inicialmente para presidir a VASP e posteriormente tendo sido Secretário de Viação Transporte e Obras Públicas na gestão de Jânio como Governador de SãoPaulo. Desenvolveu uma obra gigantesca com destaque para a construção e asfaltamento de estradas no interior Estado de São Paulo. Permaneceu Secretário na administração Carvalho Pinto e com a vitória de Jânio Quadros para a Presidência seguiu para Brasília onde ocupou a presidência do BNDE.
Em 1962, foi candidato a vice-governador na chapa com Jânio Quadros para Governador. Perdeu a eleição. Disputou a Prefeitura de São Paulo em 1965 e obteve uma esmagadora vitorianas urnas. Ganhou uma decisiva batalha por mais verbas para as capitais e com isto assegurou os recursos para seu plano de obras. Sua administração foi a mais fecunda da história da cidade. Revolucionou a fisionomia da metrópole preparando São Paulo para seu destino Sua visão de futuro guiava suas ações. Rasgou inúmeras avenidas, como a 23 de Maio, Av. Ruben Berta, a Radial Leste, a Estrada de Itapecerica. Inclusive, as Marginais.Alargou e duplicou entre outras a Av. Rebouças, a Rua da Consolação, a Av. Sumaré, a Av Pacaembu, Av Cruzeiro do Sul, antiga Rua Iguatemi, Av Rio Branco.
Construiu escolas, privilegiando o ensino profissionalizante, edificou o Hospital da Lapa e inúmeras unidades de saúde e conjuntos habitacionais. O Parque Continental, a COHAB e a primeira creche são obras suas.Desenvolveu os estudos e pilotando uma moto-niveladora iniciou as obras do Metro de São Paulo. Acompanhava pessoalmente os canteiros de obras implantados na cidade. Madrugava, dirigindo seu Fusquinha vermelho inspecionando sozinho, o andamento das obras.Era um homem enérgico. Não era de discursos, mas de ação. Fazejamento era sua palavra chave.
O ritmo de obras durante sua gestão era alucinante. Na sua mesa de trabalho no Ibirapuera, antiga sede da Prefeitura, destacava-se uma plaqueta de madeira que dizia: “o homem que se decide a parar até que as coisas melhorem, verificará mais tarde que aquele que não parou está tão adiante que jamais será alcançado”. Deu nova feição à estrutura administrativa da cidade criando as Administrações Regionais, construiu a nova Câmara Municipal, o MASP, inaugurado com a presença da Rainha da Inglaterra, criou o Tribunal de Contas do Município, promoveu uma ampla reforma do funcionalismo municipal.Foi sua a iniciativa de elaborar o primeiro Plano Diretor do Município de São Paulo.
Mais do que as obras materiais que moldaram a moderna São Paulo são os valores intangíveis de sua personalidade, como seu exemplo de dedicação ao trabalho, seu amor à cidade, sua persistência, sua dedicação que iluminam a lembrança do Brigadeiro Faria Lima. Neste momento conturbado que atravessamos, onde os verdadeiros valores parecem ter sido eclipsados, o exemplo de Faria Lima, suas virtudes como homem, como brasileiro devem ser reverenciadas para servir de norte as novas gerações.
Podemos avaliar a dimensão de Faria Lima ao percebermos que o Brigadeiro mostrou ser possível domar, gerenciar o desenvolvimento da mega cidade. Evitar a deseconomia, característica de cidades gigantes. Surgiu no momento crucial, em meados da década de sessenta quando explodia o crescimento demográfico da capital. Não admitiu ficar um dia sequer além do mandato conquistado nas urnas. Deixou a Prefeitura que a partir de então teve seus prefeitos indicados pelo governador. Pesquisas da época apontavam índices inacreditáveis, jamais igualados, que atingiam 97% de aprovação popular Sua escalada política era previsível. Ao deixar a Prefeitura vivia a frustração de não poder ofertar sua energia e capacidade de realização em favor da população que tanto amava. Faria Lima morreu no auge de sua popularidade.Teve sua vida ceifada aos 59 anos de idade.
A noticia de sua morte comoveu a população de São Paulo. Uma multidão silenciosa começou a se reunir em frente a sua casa, na rua São Benedito em Santo Amaro. Todos portando uma rosa nas mãos.Os brasileiros de São Paulo o acompanharam perplexo até a sua última morada no cemitério do Campo Grande Nascia um mito. Faria Lima ficou no imaginário paulistano como o realizador, como aquele que construiu os alicerces de São Paulo e humanizou São Paulo.
O tempo passa rápido demais. A vida é um lampejo de luz entre duas noites muito longas e escuras. Pouca gente sabe que o Brigadeiro José Vicente de Faria Lima esteve muito próximo a assumir a Presidência da República no dia quatro de setembro de 1969. Estava no Rio de Janeiro evitando uma crise militar que poderia ter tido conseqüências desastrosas. Ele seria o substituo do Presidente Costa e Silva. Os insondáveis desígnios de Deus e a cruel ironia do destino não permitiram Um enfarto fulminante, na casa de Aurora Miranda, grande amiga da família, frustrou o Brasil.
O “One-eleven” presidencial fez escala em São Paulo deixando o seu irmão o Ten Brigadeiro Roberto Faria Lima, então comandante da V zona Aérea em Porto Alegre para as cerimônias fúnebres e seguiu viagem para Brasília para dar posse ao General Médici. Comandante do III Exército. A história oculta da nação nos deixa a imaginar como poderia ter sido a realidade do Brasil caso Faria Lima tivesse assumido a cabine de comando. Vôos altos, em céus de brigadeiro, quem sabe nos teria levado a sonhar os nossos sonhos de grande nação.
O “fazejador” foi uma alternativa perdida. Por maior que sejam as homenagens a serem prestadas ao Brigadeiro Faria Lima neste ano de seu centenário de nascimento, ainda serão poucas pelo exemplo de vida que nos deixou de herança. Faria Lima, escreveu a mais bela história de amor por São Paulo e tem seu lugar cativo nas mentes e corações de São Paulo.
J.R.Faria Lima
Alguns Depoimentos
O PREFEITO FARIA LIMA
Ao ensejo do centenário de nascimento do Brigadeiro José Vicente de Faria Lima, vem-nos à lembrança a figura inolvidável do grande prefeito da capital paulista que na segunda metade dos anos 60 marcou de forma indelével a administração paulistana.
Nascido em 1909 na então capital Federal, José Vicente de Faria Lima iniciou carreira militar no começo dos anos 30, tendo participado como um dos pioneiros da Aeronáutica no Brasil. Desempenhou importantes funções na vida militar contribuindo para a consolidação da integridade do território nacional. Formado nos rígidos princípios e na disciplina das Forças Armadas, o Brigadeiro Faria Lima soube conciliar a capacidade férrea de realizar os seus planos com o respeito aos valores da democracia.
Nos governos de Jânio Quadros e de Carvalho Pinto o Estado de São Paulo pôde contar com a sua valiosa colaboração em importantes cargos da administração.
Eleito prefeito de São Paulo em 1965 com memorável votação, realizou profícua gestão marcada por grandes obras urbanas com vistas a dotar a cidade de um sistema viário compatível com o gigantismo da metrópole. Iniciou as obras do metrô paulistano, dando o passo decisivo para tornar realidade o antigo sonho da cidade que anos mais tarde se tornaria o meio de transporte mais eficiente dos paulistanos.
A figura do realizador incansável de grandes obras não pode, entretanto, obscurecer as realizações nas áreas da educação, saúde e bem-estar social nas quais foi marcante a atuação da administração do Brigadeiro Faria Lima.
Destas breves considerações fica evidente a imagem do militar exemplar, do democrata convicto, do político honesto, do administrador competente, do realizador que sabia investir em concreto e asfalto sem descurar os investimentos e as ações de caráter social.
Encerrando sua magnífica gestão, Faria Lima pôde contemplar o reconhecimento maciço dos paulistanos, desfrutando de merecida popularidade.
Poucos meses após o encerramento do mandato de Faria Lima, o Brasil foi surpreendido pela sua súbita morte justamente quando a nação muito a oferecer a São Paulo e ao Brasil. Os sábios desígnios do Altíssimo, entretanto, nem sempre nos são compreensíveis. Apesar de sua morte precoce, Faria Lima continua sendo paradigma de administrador. Reverenciar a sua memória é imperativo para despertar nas gerações a vocação de servir ao povo com retidão e generosidade. São Paulo sempre o terá como modelo de administrador que sabe enfrentar os desafios do presente e antever os desafios do futuro.
Geraldo Alckmin
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
UM SONHO DE MENINO
Meu nome é ANTÕNIO JOSÉ MONTEIRO DA ROCHA SANTOS, e o que vou relatar realmente aconteceu.
Nasci no HOSPITAL São José no Rio de Janeiro em 27/07/57 e o meu parto foi complicado: o cordão umbilical enrolou e por alguns segundos me faltou oxigênio, segundos estes que se transformaram em uma eternidade, pois me causou uma lesão cerebral . Filho de engenheiro civil, fiz inúmeros eletroencefalogramas no extinto IPASE, e segundo os médicos eu nunca teria uma vida normal. Tomei durante toda a minha infância dois remédios: EPELIM E ORTENAL, e se você quiser saber a utilidade deles, pergunte a um médico neurologista, pois toda a minha infância passei dopado com estes remédios. Dormia de 12 a 18 horas diárias, desmaiava diariamente, embora não me lembre de nenhum desmaio até hoje.
Não conseguia acompanhar os estudos em uma classe normal e os meus pais me colocaram no Colégio Joaquim Nabuco, no Brooklin, São Paulo, em uma classe de ensino especial, de alunos , peço desculpas pelo termo a seguir, retardados mentalmente. Toda a minha infância fui chamado de LOUCO, LOUQUINHO, LOUCO DO CATI, DÉBIO MENTAL e de outros adjetivos. Mesmo nesta classe especial não conseguia acompanhar os estudos, pois dormia o tempo todo devido aos remédios que tomava e a solução foi me tirarem do colégio. Fiquei vários anos sem estudar. Meus pais não deixavam eu brincar na rua devido aos meus constantes desmaios.
Morava eu em um pequeno sobrado, na Rua São Benedito, no Alto da Boa Vista, zona sul da capital, bem em frente à casa do então prefeito de São Paulo, Sr. Brigadeiro Faria Lima. Era uma verdadeira mansão: o muro era alto, o comprimento enorme, a casa era linda, cheia de seguranças à porta e um entra e sai de carros novos.
Perguntei ao meu pai: Pai quem mora ali? Ele me respondeu: o prefeito.
O que ele faz?
Ele cuida da cidade. Manda na cidade toda. Manda fazer pontes, ruas, colocar água nas casas, coloca escolas nos bairros e o hospital que você vai sempre também foi ele que mandou fazer. Manda até na polícia.
Então eu disse a meu pai: Pai, eu quero ser prefeito.
E ele me disse: Tem que estudar muito. Ser muito inteligente. Ler bastante.
Mas porque eu não estou no colégio como as outras crianças? Eu não sei ler.
Lembro-me como se fosse hoje: As lágrimas neste momento escorreram da face de meu pai, e na época eu não entendi o porquê.
Vai brincar moleque! Disse meu pai com a voz embarga de emoção...............e eu fui....................mas fiquei pensando, em meus raros momentos de lucidez, que queria ser prefeito.
Com,o eu não conseguia me lembrar de nenhum desmaio e como todos só me chamavam de LOUCO, comecei a alimentar um sonho: EU QUERIA SER UM MENINO NORMAL, PODER BRINCAR NAS RUAS, SALTAR PIPAS, BALÕES, BRINCAR DE ESCONDE-ESCONDE, ESTUDAR MUITO, LER BASTANTE E QUEM SABE, ALGUM DIA SER PREFEITO.
Com doze anos de idade, tomei aquela que seria a maior decisão de minha vida: NÃO IRIA MAIS TOMAR AQUELES MALDITOS REMÉDIOS. Meus pais quase foram à loucura. Tem que tomar, senão morre.
Respondi: morro mas não tomo. Não tomo. Não tomo.
Minha mãe era fervorozamente católica. E várias vezes a peguei orando a Deus que me curasse. Ela me levava toda semana na igreja Cristo Rei ,no Tatuapé, onde havia o Padre José, um padre alemão que benzia e segundo muitos, tinha autorização das igreja católica para fazer exorcismos. Havia em tal igreja um enorme corredor e no final a sala onde ele benzia. As pessoas que a ele eram levadas, chegavam berrando, acorrentas, amarradas, babando, xingando, agredindo e saiam bem calmas após serem benzidas. Padre José várias vezes esteve em minha casa para benze-la.
Após parar de tomar os remédios, passei a dormir cada vez menos, e não desmaiava mais. Voltei para a escola, ainda na classe dos deficientes mentais e lá estudei por três ou quatro anos, pois a minha recuperação mental era ainda muito lenta. Nunca me conformei em estudar em tal classe, pois sempre falava para mim mesmo: não sou louco, não sou louco, não sou louco. Só a partir da sexta série passei a estudar em uma escola normal: no COLÉGIO ANGLICANO DE SANTO AMARO.
Tem que estudar muito. Ser muito inteligente. Ler bastante. Quero ser prefeito! Estas frases sempre martelavam na minha cabeça, era o que eu precisava fazer para ser prefeito. Acordava cedo para ver o prefeito de São Paulo sair para trabalhar, pois a janela de meu quarto era de frete para a casa dele. Comecei a desejar cada vez mais conhecê-lo pessoalmente, e desejava também conhecer por dentro aquela imensa mansão. O que eu não podia imaginar é que esses desejos estavam bem perto de se realizarem.
Tive a grata satisfação de pegar o último bonde da zona Sul de São Paulo com o Prefeito Faria Lima e apertar a sua mão. Ele olhou para mim,passou a mão na minha cabeça e disse: menino, você será um grande homem! Fiquei pasmo. O prefeito. O meu prefeito,ali, na minha frente, realizando o meu desejo. Queria dizer a ele que era seu vizinho, que o admirava, que o via diariamente saindo para trabalhar, que queria ser como ele, que queria ser prefeito...........Não deu.
O bonde estava muito cheio e o percurso para minha casa era muito curto, quatro ou cinco pontos no máximo. Desci do bonde, fui para casa. A minha felicidade era tanta que eu gritava: vi o prefeito! Ele falou comigo!
Não me lembro quanto tempo decorreu entre este episódio e o seu falecimento. Ao saber de sua morte, não acreditei. Um homem tão bom morreu? Eu tinha que entrar naquela casa para conferir, para ver, para acreditar!
O velório dele foi em frente de casa, na casa dele. Subi, olhei para a janela de meu quarto e constatei que o movimento de pessoas era enorme, então resolvi: Eu tenho que ir lá! E fui.
Eu era apenas um pequeno menino, querendo ser prefeito. Desci a escada, atravessei a rua, e em um descuido dos seguranças consegui entrar. Fiquei muito admirado com o que vi: uma casa enorme, amplos cômodos. Era um luxo só. A quantidade de objetos de prata era enorme, os copos nas prateleiras eram de fino cristal.............como eram lindos.........a porcelana era espetacular, o que mais me chamou a atenção foi uma quantidade enorme de telefones antigos.............uma verdadeira coleção. Havia no local muitos seguranças, e eu tinha que me esconder deles, pois se me pegassem, fatalmente me colocariam para fora. Resolvi encontrar um local onde não pudessem me pegar e fui ver o prefeito. Lá estava ele, no caixão, posicionei-me em sua cabeceira, era a hora de retribuir o carinho: passei a mão em sua cabeça. Fiquei ali, parado, muito tempo, como não acreditando que ele estava morto. E foi exatamente ali, que fui fotografado pela imprensa. A foto saiu no dia seguinte em uma revista de grande circulação nas duas páginas centrais. Não me lembro qual era a revista: VEJA, O CRUZEIRO OU FATOS E FOTOS. E é esta foto, Sr. J. Faria Lima que tento resgatar.
Tem que estudar muito. Ser muito inteligente. Ler bastante. Quero ser prefeito! Sai de lá repetindo estas frases. Terminei o colegial técnico em administração em 1979, Entrei na faculdade e me formei em Economia no Makchenzie em 1982, com 27 anos. Olha sô tempo que perdi! Trabalhei em três multi- nacionais e fiz mais dois cursos: Técnico em Logística e Técnico em Informática. Atualmente sou funcionário público da Prefeitura de Praia Grande, voltei a estudar e estou cursando Técnico em Edificações em São Vicente. Trabalho na Secretaria de Urbanismo. Passei recentemente em um concurso público para agente de fiscalização e estou fazendo um curso de capacitação que é eliminatório ,em Santos. Para chegar em tal curso, pego o ônibus na Praia Grande e ele por ironia do destino passa diariamente em frente a uma réplica de bonde dos anos 60 localizado ali na praia do Gonzaga. Todos os dias esse bonde me remete aos anos 60 e ao dia que encontrei o prefeito dentro do último bonde de Santo Amaro, e por incrível que pareça, sinto sua mão em minha cabeça, e lembro de sua voz: menino, você será um grande homem! Todo dia. Todo dia isso acontece, motivo pelo qual resolvi resgatar aquela foto. E foi em uma pesquisa na internet que localizei o seu email. O resto o Sr, já sabe.
Tem que estudar muito. Ser muito inteligente. Ler bastante. Quero ser prefeito! Estas frases me tiraram da DEMÊNCIA E ME LEVARAM A ELITE INTELECTUAL, pois não é qualquer pessoa neste país que tem um curso superior e está na iminência de terminar o quarto curso Técnico.
Talvez agora o Sr. entenda melhor o significado que esta simples foto tem em minha vida. Por favor, me ajude a resgatá-la.
Com certeza o sonho ainda não acabou. Ainda acredito que vou ser prefeito da Praia Grande e sei que tenho que estudar muito. Ser muito inteligente. Ler bastante. E continuo estudando..................
Estou chorando, embargado de emoção. Me desculpe......
Um grande abraço:
ANTONIO ROCHA
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
O CAVALO ALADO E O HOMEM DA VASSOURA
Quando vereador, Jânio Quadros aliou-se a Cantídio Sampaio, seu arqui-rival na Câmara, na inglória batalha que o capitão pessepista empreendia para que o Campo de Marte fosse restituído ao bairro de Santana e deixasse de ser utilizado pela Aeronáutica. Na época, 1948, Jânio conheceu o comandante da base, Tenente José Vicente Faria Lima, mas não estreitaram relações. Foi só em 1954 que Afrânio de Oliveira – secretário particular de Jânio, agora governador – levou Lima para o governo, na presidência da VASP. Iniciou-se ali o extraordinário vôo paralelo do homem da vassoura e do cavalo alado, apelido pouco lisonjeiro dado ao Brigadeiro por aqueles que provaram de suas descomposturas ocasionais. Da VASP para a Secretaria de Viação foi um pulo, o BNDE na curta presidência de Jânio, a malograda candidatura a vice-governança na chapa do renunciante, em 62, e o período inigualável na prefeitura.
Muito pode e deve ser dito sobre a relação de Jânio e Lima, nas semelhanças, e, sobretudo, nas diferenças entre ambos. Os dois eram predestinados, mas enquanto Jânio saltava e voava sem rede de segurança, Lima cimentava cuidadosamente cada degrau de seu vitorioso percurso. Jânio era autoritário e temperamental, mas se impunha pelo carisma e pela personalidade irresistível; Lima era grosso e não raro, estúpido com seus auxiliares, mas granjeava a admiração coletiva pela competência e pela absoluta dedicação ao trabalho. Jânio era extremista, sangüíneo, e não sabia governar com o Legislativo; Lima era um “anfíbio”, por excelência, e tinha tato e inteligência para lidar com gregos e troianos, sem quebra de sua honra pessoal ou de suas suscetibilidades políticas. Foi essa última característica que colocou os dois em lados opostos quando o Brigadeiro já se aproximava de sua morte, e, curiosamente, em um momento crucial para São Paulo, quando eram ambos jovens e nem se conheciam.
Em 9 de julho de 1932, no rescaldo do horrendo incidente em que morreram quatro estudantes – Euclydes Bueno Miragaia, Mário Martins de Almeida, Antônio Américo Camargo de Andrade e Dráusio Marcondes de Souza – foi deflagrada a Revolução Constitucionalista. O pai de Jânio, Gabriel Quadros – médico, farmacêutico e agrônomo – era um perrepista de quatro costados e estava inteiramente a favor dos revolucionários. Quando soube que o M.M.D.C. montou seu quartel general na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, e de lá os contingentes começaram a ser espalhados pelo interior do Estado, ele apresentou-se como voluntário. Conhecia bem a cidade de Lorena, onde havia estudado na juventude, e aproveitando que a modesta localidade era, agora, sede do comando revolucionário da Frente Norte, não teve dúvidas: juntou a família e foi para lá, a fim de ajudar o esforço médico que se desdobrava pelo Vale do Paraíba, entre Lorena e Guaratinguetá. O médico matriculou Jânio, moleque de 15 anos, como interno na mesma escola onde estudou, o velho Ginásio São Joaquim, e colocou-se à disposição do tenente Benedito Serpa, um dos braços militares da revolução de 32. Gabriel foi nomeado tenente-médico do M.M.D.C. em 2 de setembro.
Nesse mesmo mês, as aulas do Ginásio São Joaquim foram suspensas e os internos mandados para casa, por ordem das forças revolucionárias, que desejavam transformar a escola em um grande hospital de sangue. Como possuía um campo de pouso, Lorena pouco antes se tornara sede do Grupo de Aviação Constitucionalista, que se transferiu de Itapetininga para lá, com o objetivo de conter o avanço das forças getulistas no Vale do Paraíba e na Frente Mineira. A cidade chegou a ser palco de dois embates entre forças paulistas e getulistas, o que levou os voluntários a pintarem uma grande cruz vermelha no telhado do educandário, para que os “vermelhinhos”, aviões a serviço de Getúlio, não bombardeassem o local. Um dos aviadores que participou desses bombardeios, a serviço de Vargas, na posição de observador-metralhador, foi um segundo-tenente de 23 anos, José Vicente Faria Lima.
Carioca da Vila Isabel, Faria Lima veio ao mundo em 7 de outubro de 1909. O nome do bairro era uma ironia do destino; Lima gostava de dizer que ele e seus irmãos nasceram no Rio por culpa da abolição. Seu avô materno, abastado fazendeiro no Espírito Santo, perdeu quase tudo quando a Lei Áurea foi assinada e teve que se transferir para a capital do Império com a esposa e a filha Castorina de Faria. No Rio, a moça conheceu o comerciante português João Soares de Lima, com quem se casou. Tiveram cinco filhos: José Vicente,João, Romulo, Roberto e Floriano.
O primogênito fez seus primeiros estudos no colégio 28 de Setembro. Em 1920, entrou para o Colégio Militar, concluindo o curso cinco anos depois. Com 16 anos, o rapaz atravessou um período de indecisão. Desejava seguir a carreira militar como todos os seus colegas, mas tinha fascinação por engenharia e mecânica, o que o levou a matricular-se na Escola Politécnica. Dois anos depois, entretanto, largou a engenharia e sentou praça na Escola Militar do Realengo. Em 29 deixou também essa escola. Castorina começou a ficar alarmada com o rumo incerto da carreira de seu filho. José Soares estava igualmente preocupado, mas não deixava transparecer, para não assustar ainda mais a esposa. A resposta para as aflições da família veio com uma façanha que maravilhou o mundo, em maio de 1927. O vôo transatlântico de Charles Lindbergh, num monoplano, sem escalas, de Nova York a Paris em 33 horas, causou verdadeiro furor entre os jovens aspirantes à aviação e mudou a vida de José Vicente. Ele encontrou na aviação a maneira perfeita de juntar em uma só atividade a carreira militar, a vocação para a engenharia e o deslumbramento com os aviões. Em 1929 matriculou-se no curso da Escola de Aviação Militar que funcionava no Campo dos Afonsos, formando-se com distinção em novembro de 1930, pouco depois do golpe. Como deferência por ter sido o primeiro de sua turma, recebeu proposta para ser instrutor de qualquer matéria, no curso. Sem nenhum pendor para a pedagogia, declinou o convite. Mas não demoraria a botar em prática tudo que aprendera com o curso, do qual saíra aspirante-a-oficial da arma de aviação.
Sua promoção para segundo-tenente veio em junho de 31, na mesma época em que Eduardo Gomes, agora major e servindo no gabinete do ministro da Guerra, Leite de Castro, sugeriu a criação do Correio Aéreo Militar(CAM), utilizando membros da Escola de Aviação. Gomes recrutou o competente aviador de 22 anos, que via no CAM uma espécie de curso superior, no qual poderia treinar pilotagem e conhecer o Brasil do Oiapoque ao Chuí. Aceitou a incumbência com prazer, mas o veterano do levante do Forte de Copacabana não fez segredo das condições que o rapaz teria que enfrentar no trabalho, e explicou que o CAM naquele momento consistia de aviões velhos e obsoletos, pistas de pouso danificadas ou inexistentes, além de costumeira falta de comunicação entre terra e ar. Nada disso foi suficiente para demover Faria Lima, e foi na condição de membro do CAN, servindo no interior de Goiás em julho de 32, que ele recebeu a convocação para servir no campo de Resende, junto a Eduardo Gomes, no contingente militar governista que obstava as investidas revolucionárias no Vale do Paraíba.
O improvisado hospital na escola onde Jânio estudava não chegou a funcionar. No dia 2 de outubro São Paulo capitulou e foi firmado o armistício. Passados 23 anos, o observador-metralhador se transformou no melhor prefeito que a capital do Estado revolucionário já teve. Jânio e Faria Lima foram inseparáveis durante dez anos, de 54 a 64. Quando veio o golpe, o Brigadeiro soube guardar o silêncio e a cautela necessários para um momento delicado como aquele. O mato-grossense seguiu o caminho inverso; líder popular e populista, pouco afeito a quarteladas e articulações de gabinete, desatou a escrever manifestos inúteis e a falar pelos cotovelos, elogiando quem o detestava e atacando quem não merecia. Os dois se separaram momentaneamente. No ano seguinte, o ex-presidente viu com desconfiança a possibilidade de Lima chegar à prefeitura pelo voto direto. Na verdade, um misto de desconfiança e o ciúme de ver um elemento saído de suas hostes fazendo-lhe franca sombra num campo onde ele se considerava imbatível. Alguns de seus amigos tentaram abrir-lhe os olhos. Em visita a Jânio, Farabulini Junior comentou:
- Presidente, o senhor tem que participar da campanha do Faria Lima.
- Não sei... – respondeu Jânio, entre temeroso e despeitado – não sei se este é o momento...
Farabulini foi objetivo:
- Presidente, o senhor não me entendeu; eu o estou convidando para fazer parte da vitória do Faria Lima.
A eleição já estava praticamente vencida quando Jânio resolveu finalmente emprestar seu imenso prestígio político ao Brigadeiro. Não satisfeito, o ex-presidente ainda exigiu a presença de seu fiel amigo Quintanilha Ribeiro no secretariado municipal. O Brigadeiro aceitou sem discutir, por conhecer a competência e o equilíbrio do bom Quintanilha. O homem da vassoura e o cavalo alado teriam seguido nessa bonança até o fim se Jânio não metesse os pés pelas mãos uma última vez, em 68. Instituído o bipartidarismo, o ex-presidente tratou logo de aboletar-se no MDB, trincheira da a oposição ao governo militar. Lima, pensando única e exclusivamente em São Paulo, e nos benefícios que isso poderia trazer à administração municipal, ingressou na ARENA. Jânio não o perdoou. Perguntado sobre a atitude do Brigadeiro, respondeu, friamente: “Os meus amigos estão no MDB”, e fustigou Costa e Silva até ver decretado seu confinamento, em agosto. Longe de torná-lo um mártir da ditadura, porém, o confinamento lhe saiu pela culatra e jogou-o num ócio de 4 meses em Corumbá, que serviu apenas para engordá-lo e tirá-lo definitivamente do radar político brasileiro pelos próximos 15 anos. O Brigadeiro, por sua vez, entrou em 1969 capitaneando um verdadeiro dilúvio de realizações, não superado nem por Prestes Maia. Deixou a prefeitura em abril. Morreu, coberto de glória, 5 meses depois, aos 59 anos.
Jânio viveu até 1992. Jamais perderia vasa para proclamar que “elegera” Faria Lima prefeito. Com a morte de seu mais habilidoso colaborador, por vezes não soube lidar racionalmente com a herança do Brigadeiro, que era seu aliado e companheiro, mas também seu convexo político e administrativo. Lima, em vida, nunca emitiu som que não fosse para falar de sua admiração e gratidão por Jânio. Já o ex-presidente, inseguro e emocional, revezava-se entre o fascínio pelo Brigadeiro e o ressentimento consigo mesmo por não ter sido um administrador tão operoso, e ao mesmo tempo tão centrado.
Figuras magníficas. Fica o legado de ambos, e a saudade de um tempo em que São Paulo tinha o coração de Jânio e o cérebro de Faria Lima.
Bernardo Schmidt
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
A MINHA EXPERIÊNCIA PESSOAL COM UM MITO BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO.
Jacob Klintowitz [1]
O dia era claro e o céu de um azul intenso e sem mácula, como costuma ocorrer na primavera brasileira. Um pequeno grupo de pessoas se aglomerava perto de um buraco aberto na avenida e aos poucos se formava uma multidão. Muitos olhavam para o alto e eu próprio vislumbrei um brilho intenso. Pareceu-me um reflexo metálico. Não era possível distinguir a forma exata, mas a prata e o sol e o hábito visual nos fazia crer que era um artefato metálico. De repente ele moveu-se com extrema rapidez e fez várias manobras em ângulos retos, na vertical e na horizontal, com uma agilidade surpreendente. Não conhecia nenhum avião capaz de fazer isto e não me consta que um balão atmosférico tenha esta independência de ação. Quedamos-nos todos, gente de formação e extratos sociais diferentes, com os olhos fixos no alto. Talvez não estejamos sozinhos.
Alguém - prometi o anonimato – contou-me um caso recente e triste que se passou num estado brasileiro, numa região quase deserta de gente, perto da fronteira. Região habituada ao contrabando, a visitantes incógnitos e noturnos, a ruídos não identificados. A pouca gente do local é arredia, silenciosa, observadora. Nesta área a lealdade não é apenas um atributo moral que se liga aos laços de amizade ou de amor à terra, mas uma condição necessária à sobrevivência. Na lida com o gado, às vezes, os homens afastam-se muito de suas casas e a proteção da família é obrigação primeira de toda a população. Pois foi nesta região que uma moça de família estabelecida há muitos anos, já em idade casadoira, engraçou-se por um rapaz que fazia parte de um grupo de forasteiros. Estes homens, ao que parecia, permaneceriam pouco na região, o tempo talvez de renovarem os mantimentos. Os jovens, cuidadosos, encontraram-se em terrenos baldios, quem sabe na beira do rio, ou perto de árvores frondosas. Mas em lugar de pouca gente tudo se sabe. A história terminou da maneira habitual, com o assassinato do jovem e o desaparecimento da moça que, ao que se imagina, teria se suicidado.
No Rio Grande do Sul conta-se a antiga história de uma mulher famosa por sua beleza, loira e de olhos azuis, casada com um rico estancieiro e que, não se sabe por que artes, fugiu com um estudante em férias, filho de um político de cidade próxima. Houve uma excursão punitiva e reparadora que pretendia o resgate da mulher e um duelo sem tréguas, encontro mortal entre os dois homens. Os dois grupos armados não aceitaram intermediações porque o assunto situava-se na esfera sutil e indeterminada da masculinidade ultrajada e da posse da terra e do poder político. O que resultou em incêndio, em mortes e do casal de amantes pouco ou nada se soube, senão que deles se ignora até hoje o paradeiro.
Estas histórias repetem o que conhecemos de longa data e narrações variadas e tratam das redivivas e míticas situações, como nos contam os clássicos, onde estão presentes Deuses Extraterrestres, Romeu e Julieta e a bela Helena de Tróia. Mitos distantes e tão próximos da nossa vida.
Eu testemunhei um destes mitos redivivos na vida cotidiana paulista. É a presença de um militar probo, amoroso de sua terra e de sua gente, dedicado a tornar a administração pública da maior cidade do país em exemplo de desenvolvimento e comportamento político transparente. Estou falando do Brigadeiro Faria Lima, antigo prefeito da cidade de São Paulo. Homem de perfil definido, direto, trabalhador incansável, capaz de decisões rápidas e impessoais. Ao chegar em São Paulo, em 1973, esta presença do Brigadeiro Faria Lima já tornara-se lenda e transformava-se em um mito no qual existia um herói militar, um homem que criara um exemplo de político honrado e voltado para o bem público. Um homem sem subterfúgios cujo nome a população repetia como se faz com um protetor. Na antiguidade e nas civilizações míticas jamais sabíamos o nome verdadeiro dos guerreiros ou das cidades, pois quem o soubesse exerceria o poder sobre eles. Na nossa civilização não temos os mesmos cuidados, não existe o grande nome e o pequeno nome público, já que não acreditamos nos sortilégios da metafísica. É por isso que se repetia claramente: “…no tempo do Faria Lima a cidade de São Paulo tornou-se…”. Um mito benfazejo que recebi no primeiro momento e que apontava para um possível futuro risonho para a cidade e o país. E eu me lembro muito bem que ao visitar o maior acervo de arte do país, no Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, também escutei, “O Faria Lima quando terminou de construir este museu…”.
[1] Jacob Klintowitz é crítico de arte, jornalista e autor de 110 livros sobre arte brasileira
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
O SONHO NÃO PODE TERMINAR
Durante minha infância, lembro que as pessoas ao identificarem meu sobrenome, logo me perguntavam se eu “tinha algum parentesco” com o prefeito Faria Lima.
Ao revelar que ele era meu tio-avô, percebia claramente um sorriso,uma admiração sincera e a inevitável afirmação que ele havia sido o melhor prefeito de São Paulo.
Confesso que é um pouco difícil escrever sobre uma pessoa de quem se sabe tanto e se conhece tão pouco.
Meu pai, sempre me contava suas histórias de vida e de sua ação política.
Imperceptivelmente o homem da pá e da rosa passou a ser alguém muito próximo.
Alguém que você passa a conhecer, sem nunca ter conhecido. É como na mágica da televisão que voasse se acha intimo dos artistas de todas as novelas.
Sinto um grande orgulho por sua história e por suas realizações.
Ao andar por São Paulo de hoje, nesta era onde impera a tecnologia, avalio como o Faria Lima foi inovador, alguém além de seu tempo.
Sua visão, antecipando o amanhã e principalmente seu sincero amor pela cidade.
A dedicação com que se entregava de corpo e alma em administrar esta cidade permitiu que pudéssemos ter a cidade que temos Para mim mais do que suas incontáveis obras, penso em uma pessoa que acordava às 5 da manhã e já iniciava sua jornada de trabalho totalmente focado. Um obstinado, apaixonado pelo que fazia. Acredito que ele sabia da importância e s necessidade de terminar sua missão. Algo lhe dizia que tinha que fazer tudo com rapidez. Como se soubesse que não ficaria muito tempo entre nós.
Hoje agradeço a meu pai pelas histórias que me contava. Da importância de se ter um sonho. Através dele aprendi que existem pessoas que podem tornar tais sonhos realidade. Pessoas corretas, que acordam cedo e trabalham, pessoas que fazem acontecer.
Meu tio avô, aquele que para mim quando pequena, era o tio de meu pai, o irmão de meu avô, uma estátua em uma das mais famosas avenidas de São Paulo, aquele que havia sido o melhor prefeito desta cidade não pertence mais a nossa família Faria Lima, hoje ele pertence à todos os paulistanos e porque não a todos os brasileiros.
Sua imagem, mais que suas obras espalhadas por São Paulo e sua pá e a rosa, símbolo de sua carreira política, estão vivos em todos que acreditam em pessoas como ele.
Hoje ao idealizar o futuro, espero que meus três filhos caminhem com essa vontade de trabalhar não só por si mas pela sociedade, espero que se tornem pessoas corretas, trabalhadores que acordam cedo e realizam com seu sonho, brasileiros que confiam que o mundo será melhor e eles serão parte disso. O prefeito Faria Lima é um grande exemplo de homem e de pessoa, que todos possam conhecê-lo e se identifiquem com ele. O sonho tem que continuar ..
Roberta Faria Lima Opice Blum
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
ETIMOLOGIA E O SONHO
Eu me chamo Thany. E além desse nome quase comum, quase diferente, carrego comigo o nome da minha família. Carrego com orgulho. Orgulho porque vejo um brilho nos olhos dos mais velhos quando descobrem meu nome mas, principalmente pela curiosidade despertada nos mais novos.
Para minha geração o nome Faria Lima possui uma simbologia indefinida. Como se fosse uma aura que envolve a cidade. Algo mistico. Querem entender de que é feita e a quem atribuir a energia que envolve a cidade. Esta camada de energia é feita pelos anseios e desejos de todos aqueles que habitaram, viveram e trabalharam nesta terra de Piratininga. Ela é acumulativa. Sabem, entretanto, que Faria Lima, o prefeito, foi um daqueles que deixaram uma contribuição mais significativa, diferente e querem conhecê-lo melhor.
Caminhando pela minha cidade, imagino a importância de suas marcantes obras, arrojadas e incompreendidas à sua época e como seria São Paulo sem elas.
Imagino a vontade, motivação, a persistência e a capacidade de liderança de quem liderou toda esta metamorfose ocorrida na metrópole.
Percebo que mais do que plantar viadutos, avenidas, marginais, pontes, creches, hospitais e construir o Metrô, Faria Lima plantou sonhos no coração dos brasileiros.
Não um sonho qualquer.
Um sonho possível, concreto.
A buscar o bem comum, a prioridade básica de servir aos outros, principalmente aos menos favorecidos.
Ensinar a pescar e não apenas dar os peixes. Enfim, fazer de São Paulo uma urbe mais humana, tornar o Brasil mais justo, sem os contrastes da desigualdade que estimula a violência, valorizar a criatividade do brasileiro e demonstrar que a política é coisa de gente honesta, séria, persistente e dedicada.
Não é apenas isso.
Faria Lima despertou a auto estima da população e fez renascer, naquilo que acredito, o poder da esperança.
Mexeu com a alma do povo e mostrou o futuro para São Paulo.
Nunca soube ao certo o significado de Thany.
Uma ilha, uma morada de deuses perdida no Mediterraneo. Se pelo menos eu tivesse uma letra a mais. Caso meu nome fosse Tânia, seria a coroa de flores, a diadema, aquela que é paciente, perseverante e habilidosa, quando precisa enfrentar obstáculos.
Mesmo assim não me importo, sei exatamente o que o nome da minha família significa.
Faria Lima, aquele que coloca o máximo de si em absolutamente tudo que faz. Aquele que é grande. Sólido. Inteiro. O que tenta entender a matéria misteriosa do pensamento, e sonha. E sonhando, assim, sem medo, constrói para si e para todos a sua volta um mundo um pouco melhor.
Eu não conheci meu tio avô, mas aprendi com meu pai todas essas coisas.
Consegui enxergar em seu legado, seus ensinamentos.
O quanto comprometimento é importante, a hora certa de colocar os pés no chão, a beleza em sonhar o sonho possível.
Aprendi que os jovens precisam se apegar a pilares.
Todo mundo precisa.
Deus,família, honestidade, amor, fé.
Sem esses pilares nos perdemos, deixamos de enxergar tudo aquilo que realmente importa.
Se estamos todos condenados a liberdade precisamos parar e fazer as escolhas certas.
Precisamos ser justos com aquilo que acreditamos. Eu acredito em tudo que meu pai me ensinou. E em tudo aquilo que meu avô e meu tio avô o ensinaram. Na importância da dedicação e no amor por absolutamente tudo que se faz.
Sinto um respeito imenso em poder carregar o nome deles comigo. Tive a felicidade desta herança.
De tudo que aprendi, uma lição que jamais esquecerei e desejo relembrar a minha geração e as próximas, é que "a vida começa a cada dia e que todos temos o dever de fazer o melhor como se o mundo estivesse nascendo neste exato instante."
O que merece ser feito merece ser bem feito.
Espero que este meu testemunho, estampado num livro tão importante, seja uma mensagem para o futuro e venha a ser lembrado por todos, como uma ode a quem acreditou no trabalho e no amor como ferramentas da construção de um sonho.
Um belo sonho possível.
Disse.
Thany Sanches de Faria Lima
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
FARIA LIMA: UM MILITAR COM ALMA CIVIL
Paulo Nathanael Pereira de Souza
Membro Titular da Academia Paulista de Letras.
A visão civil dos militares é um fenômeno raro e que foi posta a prova, mais de uma vez, no decorrer do regime castrense que, a partir de 1964, se instalou no Brasil. Depende ela sobretudo de um exercício cultural dificílimo (para o qual, aliás, necessário se faz possuir talentos especiais, mais do que propriamente estudos e treinamentos), que só a poucos contemplou durante as duas décadas em que tivemos nos principais postos de governo grande oficiais das três armas, brilhantes administradores na área de sua formação profissional, mas nem sempre tão eficientes no trato com a sociedade civil, exatamente pela dificuldade com que se defrontavam na aplicação de sua expertise de quartel aos desafios mais amplos, complexos e específicos, que nasciam das coletividades heterogêneas do extra muros do mundo da farda. Mas, tudo isso são teses para os historiadores do futuro. O que interessa, no momento, é dar destaque à figura do Brigadeiro José Vicente de Faria Lima, de quem fui amigo, sobretudo durante o governo desse outro saudoso e magnífico homem público, que se chamou Carvalho Pinto. Esse Brigadeiro corporificava uma personalidade do mesmo estôfo do Brigadeiro Eduardo Gomes ou deste outro monumento inesquecível, que atendia pelo nome de Brigadeiro Montenegro, fundador do CTA/ITA, em São José dos Campos. Eram militares de alta patente, que tinham alma civil, e puderam servir exemplarmente a nação, ao colocar escoras nas fundações do futuro do Brasil e, com isso, angariar a eterna gratidão do povo. Acabou ele sendo um dos três ou quatro maiores prefeitos, que o município de São Paulo teve nos últimos cinquenta anos de sua longa história, que vem de João Ramalho até hoje.
Tendo nascido no Rio de Janeiro, em 7 de outubro de 1909, Faria Lima completaria neste ano, se vivo fosse, cem anos de sua idade. Faleceu em 1969, mas teve tempo de deixar riquissíma biografia, na qual se destacam, primeiro por sua atuação na Aeronáutica, quer como piloto do Correio Aéreo Nacional, um dos fatores mais eficazes da unidade nacional naqueles longinquos anos 30/40, quer como diretor do Campo de Marte, quando travou contato com a vida paulistana e por ela se apaixonou. É, aliás, um caso raro de amor de um carioca por esta Paulicéia Desvairada (para usar a expressão de Mário de Andrade). E, depois, por seu excelente desempenho na Secretaria da Viação e Obras Públicas do Estado de São Paulo, para a qual foi nomeado pelo governador Jânio Quadros, após avaliar sua notável performace como gestor, ao presidir a VASP, que por suas mãos saiu do estágio pré-falimentar, para tornar-se uma empresa próspera e saudável. Mas, sua consagração como homem público se daria em 1965, com sua eleição à Prefeitura Municípal. Conciente de que São Paulo, naquela altura crescia , a cada ano, uma Brasília, a cada dois, uma Curitiba e a cada três uma Porto Alegre, e tendo em vista a expertise adquirida como Secratário Estadual de Obras, deu prioridade à abertura das grandes vias, que cortaram a capital em várias direções, como as avenidas marginais aos rios Pinheiros e Tietê, avenidas radiais, como a Sumaré, a Radial Leste, a 23 de Maio, a Rubem Berta, e a Radial Oeste, que, aliás, recebeu seu nome, após seu falecimento. Ouso afirmar que, sem essas obras, São Paulo, hoje, estaria absolutamente intransitável, devido ao número de veículos que diariamente invadem o seu sistema circulatório. Ao mesmo tempo, deu partida às obras do Metrô. De tal forma a sua popularidade se expandiu pelos bairros paulistas, que ao terminar seu tempo na Prefeitura, desfrutava ele de 97% de apoio da população (deve-se talvez a tamanha popularidade a cogitação, por parte dessa misteriosa entidade, que à época se denominava “Comando Revolucionário”, da hipótese de lançá-lo candidato à sucessão do Presidente Costa Silva. Sua inesperada morte interrompeu as negociações e mudou a história do Brasil). Para se avaliar a penetração e o prestígio do nome de Faria Lima entre os brasileiros de todos os quadrantes e condições sociais, basta assinalar que, após seu falecimento em 1969, por efeito de um enfarte fulminante do miocárdio, os índios do Brasil Central organizaram uma cerimônia funebre Quarup em sua homenagem. Os únicos brancos a merecerem tal honraria, além do Brigadeiro, que deles se tornara amigo, desde os ttempos do Correio Aéreo, foram os irmãos Villas-Boas e o etnólogo Noel Nutels. Foi o derradeiro Quarup para um não-índio, como decretou Aritana, o cacíque, para seu povo do Parque Xingú.
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
UM TRATOR CHAMADO FARIA LIMA
Fui opositor de Faria Lima em duas eleições: Prefeitura de São Paulo e Vice Governança do Estado.
Essas disputas transcorreram em nível tão elevado que nos tornamos amigos e pudemos juntar esforços em beneficio da nossa grande cidade.
Fui Governador na época em que Faria Lima foi Prefeito e tivemos perfeito entendimento, apesar de diferentes origens políticas.
Entre as numerosas situações em que atuamos juntos, destaco um episodio que considero muito importante. Certa ocasião convidei Faria Lima para uma solenidade alusiva ao Dia da Árvore, que seria realizada no Palácio do Governo.
Finda a solenidade, fomos ao meu gabinete para o tradicional cafezinho e aproveitamos para trocar idéias sobre vários assuntos e, principalmente, sobre o que passo a mencionar.
Havia a necessidade do alargamento de algumas importantes artérias da cidade e as obras não podiam ser executadas pela Prefeitura, por envolverem propriedades do Estado.
A Avenida Rio Branco precisava de parte do jardim do Palácio dos Campos Elíseos, então residência do Governador. A Rua da Consolação precisava de parte do terreno da Escola Estadual Marina Cintra e também de uma área do Departamento de Águas e Esgoto do Estado. A Avenida Cruzeiro do Sul, necessitava de terreno pertencente à Polícia Militar. A Avenida 23 de Maio, precisava passar em local ocupado por prédio da Secretaria da Saúde do Estado.
Havia uma comissão mista Estado-Prefeitura, que estudava como resolver o assunto. Verificamos nessa conversa que a questão se resumia a Estado e Prefeitura não havendo o envolvimento de terceiros e decidimos abreviar a solução e atacar de pronto o inicio das obras.
A comissão que estudava como fazer iria se ocupar de como solucionar o assunto.
No dia seguinte a esse entendimento o Prefeito, que era muito decidido, compareceu na parte da manhã ao Palácio do Governo já munido de um trator e, com a minha autorização, derrubou o muro da casa onde residia o Governador, iniciando o alargamento da Avenida Rio Branco.
Na seqüência, foram atacadas as demais artérias mencionadas, todas de grande importância para a nossa São Paulo.
Fico imaginando como seria hoje o trânsito já caótico da nossa cidade não fosse a decisão ousada que juntos tomamos.
No momento em que comemoramos o centenário de nascimento de Faria Lima é justo que rendamos homenagens à esse Paulistano Honorário que tanto fez pela nossa fabulosa Capital.
LAUDO NATEL
----------------------------------------------------------------------------------------------------------
ARTIGO EM HOMENAGEM AO BRIGADEIRO JOSÉ VICENTE DE FARIA LIMA.
Deputado Barroz Munhozpresidente da Assembléia Legislativa de São Paulo
É difícil falar de José Vicente de Faria Lima, pois não o conheci. Brigadeiro da Aeronáutica, prefeito que com suas obras transformou São Paulo numa das maiores cidades do mundo, tornou-se referência por ter feito uma das mais impressionantes administrações públicas que o país já viu.
Sei que o maior mérito de Faria Lima foi ser um excepcional executor. Tirou os projetos de Prestes Maia da prateleira e fez. Sempre gostei do termo Fazejamento, que Faria Lima usava. Ele dizia que planejamento é fundamental, mas o importante mesmo é fazer. A primeira creche, hospitais, escolas, 54 pontes e viadutos, as marginais Tietê e Pinheiros, avenidas como a 23 de Maio, 10 milhões de metros quadrados de asfalto, a Câmara Municipal, o Parque Continental, a COHAB e o Metrô, são obras dele.
Faria Lima não tinha medo de colocar a mão na massa. Vistoriava as obras pessoalmente a bordo de seu Fusca vermelho, tirava assessores da cama de madrugada e cobrava prazos dos empreiteiros com energia. Diziam que 6 da manhã o gabinete dele já estava aberto. Olhar de perto o legado que Faria Lima deixou para São Paulo me faz crer que, além de exímio “fazejador”, sabia enxergar o futuro: foi ele que criou o primeiro Plano Diretor da cidade, as administrações regionais e o Tribunal de Contas do Município. Com tudo que ou